sexta-feira, 13 de maio de 2016

Vícios à mesa



Por razões profissionais e por prazer pessoal frequento com regularidade restaurantes em diversos pontos do país. E manda a verdade dizer que tenho assistido a uma notável melhoria de qualidade em muitos itens, sendo os mais importantes, como é evidente, as matérias primas, as técnicas de confecção e a forma como são apresentadas. Melhorou muito também, na grande maioria dos casos, o conforto dos clientes, a decoração dos espaços e a sua apresentação. Está ainda tudo muito longe de ser perfeito mas é inegável a evolução verificada.

Dito isto, há ainda aspectos fundamentais no negócio dos restaurantes que tardam a acompanhar esta evolução positiva. Em alguns casos, até pelo contrário, notou-se mesmo uma degradação sensível no serviço prestado aos clientes. Falo hoje concretamente do serviço de mesa, que considero o calcanhar de Aquiles desta actividade.

As falhas grosseiras, a falta de profissionalismo, a ignorância a arrogância e, em certos casos, a má criação muitas vezes substituíram sem vantagem algumas das velhas pechas no atendimento ao cliente,em muitos dos nossos restaurantes. E aqui o panorama é transversal: tanto ocorre nos estabelecimentos mais populares e tradicionais (e nem sempre mais baratos) como naqueles mais pretensiosos a atirar para o fino e com contas finais bem carregadas.

A maior culpa nem será dos próprios empregados de mesa, nem eles muitas vezes têm a noção das suas próprias limitações. Mas muitos empresários acham que vale a pena investir muitos milhares de euros em decoração, um pouco menos na contratação de cozinheiros e muito pouco na formação de quem recebe o cliente e o serve à mesa. A profissão, ainda com o estigma da palavra "criado" colada à função não é considerada  prestigiante de forma a atrair os profissionais qualificados que as Escolas de Hotelaria apesar de tudo vêm formando e os empregadores não a valorizam nem lhe reconhecem a importância.

Em alguns restaurantes ditos de fine dinning há agora a moda de ter um relações públicas, na maior parte das vezes uma simpática e bem parecida menina que nos conduz à mesa entre sorrisos e salamaleques. A verdade é que depois de sentados nunca mais lhe pomos a vista em cima, e os sorrisos acabaram nesse instante. É então que adquirimos o espantoso dom da invisibilidade que permite que muitos empregados passem por nós e não nos consigam ver por muito que esbracejemos e que requeiramos apenas um pouco de atenção. Algumas vezes ficamos com a nítida sensação que só somos atendidos quando eles finalmente consideraram que já penámos o suficiente por algum pecado passado que tenhamos cometido.

Em muitos restaurantes populares a rudeza sem cerimónias é o prato do dia :demora em levantar os restos da refeição anterior, limpeza da mesa às três pancadas com um pano húmido que já passou por todas as outras mesas, talheres atirados para cima do tampo, pratos colocados em pilha e o freguês que os distribua, pratinho com azeitonas que já vem com os caroços de outros clientes, entre outro conjunto de delicadezas very typical indeed.

Nos restaurantes finos e elegantes, (só em alguns deles, temos que ser justos) o que mais se destaca é a requintada sobrançaria. As batas negras impõem respeito, a pose é empertigada, o sorriso condescendente. Mas a impertinência depressa desaparece quando o discurso com a descrição do prato se engasga num termo de que ele desconhece o significado ou quando perguntamos que ingrediente é aquele e o moço bate em retirada a dizer que vai perguntar ao chefe. Santa nossa! É nessa altura que tenho por vezes saudade daqueles antigos profissionais, exímios de mãos, que despinhavam o peixe à nossa frente, trinchavam a carne ou desossavam uma ave com a precisão de um relojoeiro. A cozinha de sala está hoje fora de moda mas era um regalo para os olhos. Aqueles crepes flambeados á minha frente valiam a refeição.

Como podem as coisas mudar? Não há segredos, toda a gente sabe! É saber investir em recursos humanos da mesma forma que se paga em decoração ou se é exigente nos equipamentos, é pagar condignamente aos bons profissionais, de acordo com o seu mérito, é saber motivá-los e mantê-los empenhados  no projecto. É mostrar aos clientes que vale a pena ser exigente e que um melhor serviço é um valor acrescentado que que tem retorno.

1 comentário:

  1. Um comentário, que diz tudo.Infelizmente com uma grande dose de verdade.Confesso que já deixei de entrar em alguns restaurantes , por causa do mau serviço.!!
    Sou um ex Profissional de Sala (Serviço de mesas!)

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